Arquivo da Categoria ‘De 1800 a 1900’
BAIRROS PRÓXIMOS
Certa vez o velho ator Amaro seguia, todo altaneiro e empertigado rumo à casa, pelas ruas da cidade. Eis que, da porta do seu estabelecimento de secos e molhados, um lojista conhecido, reverente, o saudou à passagem.
E ele, prontamente:
– Boas tardes, Sr. Catumbi!
– Perdão… sou Estácio…
– Ai sim, tem talvez razão, desculpe… Mas como são estações quase pegadas…
Disposto a não mais cometer essa gafe, decidiu Amaro sempre ler o nome do proprietário na fachada da loja, antes de responder ao cumprimento. Assim que, pouco adiante, saudou o homem à porta:
– Boas tardes, Sr. Borges & Irmãos!
DR. SARARÁ
José Bonifácio tinha procurado um curandeiro conhecido por “Sarará” para tratar das hemorróidas. Com resultados desastrosos, que deixaram suas “partes pudendas” em petição de miséria! E ele próprio profundamente contrafeito e humilhado! A partir de então, quando alguém queria enfurecer o Ministro, bastava perguntar-lhe notícias do tal curandeiro.
Numa festa de entrudo, a que José Bonifácio assistia, aproximou-se dele dançando um dominó mascarado e, no tom mais inocente, perguntou-lhe:
– E então, ministro, como vai o Dr. Sarará?
José Bonifácio, rubro de ódio, já erguia a bengala para desferir uma pancada na cabeça do atrevido, exclamando:
– Ah, patife!…
Quando o dominó retirou a máscara, revelando que tratava-se de D. Pedro I. Que deu uma sonora gargalhada, e saiu dançando…
MAÇADA
Uma mulher, empunhando um frasco de remédio e procurando acordar alguém, que dorme pesadamente, se lastima:
– Que maçada! O doente caiu num sono tão profundo, que não consigo acordá-lo para dar-lhe o narcótico.
TROCA LETRA
O ator Amaro, já velho e em fim de carreira, depois de desempenhar um papel muito difícil, que lhe demandara muito esforço, costumava dizer aos amigos, exausto:
– Vocês verão… verão: mais dia, menos dia, acordo morto…
Nos seus últimos anos, a memória de Amaro começava a traí-lo, e ele fazia confusões homéricas no palco:
No auge de uma cena dramática declarava à personagem, toda banhada em lágrimas, que o seu marido morrera de bric-à-brac…
Bric-à-brac queria dizer: béri-béri…
Noutra ocasião, em certa altura da peça, investia contra outro personagem, ameaçando-o:
– Se dás mais um passo, racho-te a bengala com esta cabeça!
QUASE ISSO
De outra vez, tendo de proferir a frase final de um terceiro ato, o velho ator Amaro, referindo-se ao qui-pro-quo que motivara um telegrama ambíguo, com expressão de alta seriedade, saiu-se com essa:
– Aqui têm, minhas queridas senhoras, como a desgraça de uma família inteira pode originar-se no peri-có-có de um telegrama anfíbio…
ELAS, O CONTRÁRIO!
O ator Peregrino Menezes conversava numa roda de gente do teatro. Comentava-se a decadência da cena brasileira, fenômeno que começava a caracterizar-se de modo intenso, e o Peregrino referindo-se aos triunfos da opereta e ao declínio do drama, disse:
– Atualmente para que o ator possa ganhar alguma coisa no Brasil, é preciso que cante.
– E as atrizes? – Perguntou uma linda atriz que estava na roda.
-Ah! – Respondeu o ator – com essas é preciso que sejam “cantadas”…