Arquivo da Categoria ‘Anedotas Históricas e Piadas Populares’

COMIDA PESADA

O barão das Catas Altas era o tipo perfeito do novo-rico. No século XIX ninguém gastou com tanta ostentação, atirando idiotamente tanto dinheiro fora, como ele. Acendia charutos com cédulas de libras; nos jantares, quebrava a porcelana inglesa e os cristais da Bohemia, por pura farra. Queria assombrar o mundo. De origem humilde; era sacristão quando recebeu por herança do irmão da mulher, que não tinha descendentes, as minas do Gongo-Soco em 1809.

Certa vez em um de seus faustosos banquetes – onde os pratos, os talheres, as taças, as baixelas, tudo, era ouro – à certa altura os criados serviram almôndegas cobertas com um molho espesso e cheiroso. Os “papa jantares” metem os garfos nas almôndegas, mas estas resistem aos talheres. O barão, com os olhos úmidos de prazer, solta uma gargalhada de estrondo. As almôndegas eram de ouro!

– Sirvam-se, senhores! – exclama o nababo à cabeceira da mesa, desmanchado em gargalhadas. Assim, cada comensal ao retirar-se levava consigo uma almôndega.

E quando morreu, em 1839, o tolo barão estava na miséria, não deixando à família mais do que dívidas!…


FANFARRÃO MINÉSIO

O despótico governador de Minas gerais na época colonial, Luís da Cunha Meneses, era chamado “Fanfarrão Minésio”; pelo menos é o que consta das “Cartas Chilenas”, atribuídas a Tomás Antônio Gonzaga, que circularam em Vila Rica entre 1787 e 1788, onde ele é descrito da seguinte forma:

                        (…)

                        Tem pesado semblante, a cor é baça,

                        O corpo de estatura um tanto esbelta,

                        Feições compridas e olhadura feia;

                        Tem grossas sobrancelhas, testa curta,

                        Nariz direito e grande, fala pouco

                        Em rouco, baixo som de mau falsete;

                        Sem ser velho, já tem cabelo ruço,

                        E cobre este defeito e fria calva,

                        À força de polvilho que lhe deita.

                        Ainda me parece que o estou vendo

                        No gordo rocinante escarranchado,

                        As longas calças pelo umbigo atadas,

                        Amarelo colete, e sobre tudo

                        Vestida uma vermelha e justa farda.

 

                        De cada bolso da fardeta pendem

                        Listradas pontas de dois lenços brancos;

                        Na cabeça vazia se atravessa

                        Um chapéu desmarcado; nem sei como

                        Sustenta só do laço o peso.

                        Ah! tu, Catão severo, tu que estranhas

                        O rir-se um cônsul moço, que fizeras

                        Se em Chile agora entrasses e visses

                        Ser o rei dos peraltas quem o governa?

 

DESTINO CRUEL

No ano de 1550 a falta de mulheres brancas, na Bahia, era tão sensível que a rainha dona Catarina de Portugal enviou várias moças órfãs, para que se casassem com os principais homens da terra.

Sua Majestade, contudo, teve que dizer às freiras que ordenassem às suas pupilas que fossem ser grandes senhoras no Brasil – “sob pena de excomunhão”, se necessário! Pois a maioria delas preferia destino mais brando: cuidar de leprosos, cultivar a terra ou faxinar conventos e igrejas; desde que permanecendo em Portugal. 

AS MALAS DO CHALAÇA

D. Pedro I tinha queda por gente reles. E ninguém gozava de mais prestígio junto ao fundador do império brasileiro que Francisco Gomes da Silva, o Chalaça. Ele era a encarnação do que havia de mais ordinário. Bêbado, capoeira, navalhista, tocador de violão, vivia ele em farras pelos prostíbulos, nas ruas fazendo serenatas, ou metido em brigas com outros vagabundos. Mas D. Pedro I teve verdadeira fascinação pelo Chalaça: tirou-o da barbearia em que ele trabalhava, e levou-o para o paço; fez dele conselheiro do império, seu confidente, e o homem que mais força tinha sobre o imperador. Os ministros tentavam em vão livrar-se dele.

Só depois de muitos anos, no tempo da segunda imperatriz, conseguiram os ministros afastar o Chalaça do Brasil, e só o conseguiram com o apoio decidido da soberana – a quem D. Pedro, por paixão, não queria contrariar.

Mas D. Pedro ficou com o ministério atravessado à garganta! Para vingar-se dos ministros, resolveu ir pessoalmente arrumar as malas do favorito, com suas próprias mãos. Depois se gabava disso aos ministros. Fazia-os esperar horas e horas e, quando aparecia dizia:

            – Demorei porque estava arrumando as malas do Chalaça!…

E A PRIMEIRA EUROPÉIA?

Escreveu Monteiro Lobato“Nós homens sabemos, com certeza de pedra e cal, qual o antepassado branco que primeiro pisou estas plagas. Era um Pero, ou Pedro… a não ser que fosse um Vicente, o Yanez Pinzon. Mas nossas gentis contrárias em sexo ignoram em absoluto qual a vovó inicial que veio diluir a brancura de pele no pigmento dos Gês e Nu-Aruaks, (…) Seria portuguesa? Seria francesa?

Jean de Lery conta que em seu navio, além do reforço masculino mandado por Coligny ao senhor Nicolau de Villegaignon, vinham cinco francesas. Seriam Rosemonde, Yvette, Colette, Suzanne e Louise as primeiras arianas que respiraram o ar brasílico?”

As cinco francesas que vieram em 1556, chegaram num tempo em que tudo eram araras e papagaios por cima das frondes e apetites canibalescos por baixo. Nada indicava o surto da nova fauna cuja semente Tomé de Sousa fez vir consigo.

LESA-MAJESTADE

Alguém aproximar-se de um rei não era bem assim. Implicava em atender antes a um cerimonial. Depois – se o rei assim entendesse – teria que ser convidado pelo monarca a aproximar-se. Como bem verificou D. Diogo d’Almeida, Prior do Crato.

Certo dia, estando El-rei D. João II sentado junto de um bufete, com o rosto virado para a parede, D. Diogo passou por trás dissimuladamente, sem tirar a gorra, …persuadido de que El-rei o não via.

– Afastai-vos lá – exclamou, em tom de galhofa, o soberano, que lhe percebera a sombra na parede – não sabeis que os reis não têm direito e avesso?!…