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POBRE INOCENTE

Altas horas da noite, a senhora Cunegundes ouve abrir a porta e como seu marido é useiro e vezeiro nas noitadas, arma-se de pau de vassoura e atira-se com denodo contra o noctívago:

– Canalha! Isso são horas de vir para casa? Toma, toma, patife. – E descarrega-lhe paulada sobre paulada.

– Piedade! – bradou aflito o agredido – olhe que eu não sou seu marido, sou um simples ladrão.

PARA PAISANOS

Um coronel levou um dia para seu camarote no teatro, o seu ordenança, que nunca tinha visto ópera. No fim do espetáculo (representava-se o Othelo), perguntou ao praça:

– Ó 98, que te pareceu?

– Saberá vossa senhoria, meu comandante, que para paisanos até que não se saíram lá muito mal.

LUVAS

Era num daqueles bailes de meia tigela, onde tanta desenvoltura e alegria reina, e que principalmente se compõe de costureiras e estudantes, capelistas e caixeiros.

Chega-se um estudante folgazão a uma das mais dengosas daquelas senhoras, e convida-a para dançar.

– O senhor, – lhe responde ela com ar de desdém – esqueceu-se de trazer luvas.

– Não tem dúvida, minha senhora, – acudiu ele no mesmo instante – eu costumo no fim de cada contradança lavar as mãos.

CAVALO DEVOTO

Tendo um judeu vendido a certo fidalgo um cavalo, quis insistir que era turco. O fidalgo, depois de o pagar por bom preço, mostrou-o ao seu mordomo, que era entendedor, dizendo-lhe:

– Que te parece? Será turco ou não?

– Quer V. Exª que vos fale a verdade? – respondeu o bom homem, depois de examinar o animal. – Digo-vos que este cavalo é tão cristão quanto o Senhor.

BANQUETE

Um grande comilão relatava a um amigo um banquete de uns seis pratos, de que participara:

– Nos foi servido um peru recheado enorme; delicioso, gordo, suculento. Com ricos acompanhamentos. O melhor peru que já comi na vida! Tão bom que não deixamos senão os ossinhos, e esses mesmo muito bem chuchados.

– E, – perguntou o amigo – quantos eram os comensais à mesa?

– Apenas dois: eu e o peru.

NÃO GOSTAVA DE BRINCADEIRAS

Um fanfarrão, acostumado a deixarem passar sem castigo as suas insolências, insultou um dia um oficial. Este, por única resposta, pregou-lhe uma bofetada que retiniu por todos os ângulos do botequim onde se achavam, e atraiu a atenção de toda a gente.

– Isso é sério? – perguntou o espadachim, impertigando-se.

– Muito sério. – respondeu o militar.

Ao que o primeiro replicou altivamente:

– Lá me parecia; porque comigo ninguém brinca!