Arquivo da Categoria ‘De 1600 a 1700’
MISTÉRIO
Um homem tinha um barril de vinho, muito bem selado. Mas um escravo malandro fez-lhe um buraquinho na parte de baixo por onde ele bebia, e depois fechava com um botoque. O homem admirava-se de que, embora o selo estivesse intato, o nível do vinho vinha sempre baixando. Quando a mulher do homem sugeriu que o vinho pudesse estar escapando pela parte inferior, ele exclamou:
– Grande idiota! Não vês que não é embaixo que está faltando vinho, mas em cima?
RECONHECIDO
Um conhecido disse a um idiota que acabava de tornar-se pai:
– Eu o cumprimento pelo nascimento do seu filho.
Ao que o novo pai retorquiu:
– O mérito não é só meu. Devo também aos meus bons amigos.
NÃO ENTENDO
Foram contar ao marido de uma mulher muito velha e feia, que, quando ele não estava em casa, certo vizinho costumava deitar-se com ela.
Ao que o marido enganado, coçou a cabeça e retrucou:
– Não entendo… No meu caso, como marido, é minha obrigação. Mas, quanto ao pobre Fulano, o que o terá levado a fazer isso?
COMÉDIA
O cavalheiro D. Francisco Manuel de Mello – escritor, militar, político e homem de teatro -, e o rei D. João IV (1604 – 1656) tinham bom relacionamento. Tanto um quanto o autro tinham uma amante. Por coincidência, ambas as mulheres de quem recebiam favores, eram damas de alta qualidade e casadas (embora os seus nomes fossem mantidos em segredo, por cavalheirismo). Certa noite escura, sem lua, os dois acorreram a suas respectivas amantes, e esbarraram, no vão de uma escada sem iluminação, com rivais que os levaram a desembainhar suas espadas e a lutarem. Só mais tarde que viriam a descobrir que a amante de ambos, era a mesma senhora “de muito bem fazer a quem lh’o pedia”, e que, no escuro, um terçara espadas com o outro!
DITADOS DO SÉCULO XVII
A célebre coletânea provérbios luso-brasileiros, de Antônio Delicado, registra vários provérbios de cunho humorístico, como estes:
- Tenhamos o frango, então falaremos na salsa.
- Andava na égua e perguntava por ela.
- Quando se forem os hóspedes, comeremos o pato.
- Melhor é o meu que o nosso.
- Sacode o rabo o cão, não por ti, mas pelo pão.
- Negócio em sociedade: dor de cabeça minha, e as vacas vossas.
- Quem troca odre por odre, algum deles é podre.
- A viúva rica, com um olho chora e com o outro pisca.
- Lágrimas de herdeiros, risos secretos.
- Não compres mula manca pensando que há de sarar, nem cases com mulher má, pensando que há de se emendar.
- Castigar velha e tirar pulga de cão, perda de tempo são.
- Ensaboar a cabeça de burro é perda de sabão.
- Não há geração sem prostituta ou ladrão.
- Quem tem doença: abra a bolsa (carteira) e tenha paciência (“paciente” vem de paciência)
- Amor louco: eu por ti e tu por outro.
- Um mesmo canivete me corta o pão e o dedo.
- O que houveres de comer, não o vejais fazer.
- Acudi-me cachopas (venham a mim garotas) que já tenho botas.
- Miguel, Miguel, não tens abelhas e vendes mel.
- Com latim, rocim e florim, andarás mandarim. (boa conversa, bom cavalo e dinheiro)
- Amor de prostituta e convite de estalajadeiro, sempre custam dinheiro.
- Quem anda em demanda, com o Diabo anda. (metido com advogados)
- Quando em casa não está o gato, estende-se o rato.
- Tal grado haja quem o asno penteia. (Tem gosto para tudo…)
- Cuspo para o céu, cai-me no rosto. (Colhe-se o que se planta)
- Tenho ovelhas, não tenho orelhas. (Ovelhas fazem barulho; para tudo é preciso sacrifício)
- Quem com os cães se deita com pulgas se levanta. (Quem anda em más companhias)
- Tirar as castanhas do fogo com a mão do gato. (Aproveitar-se de outrem)
- De noite à (luz da) candeia, a burra parece donzela.
- O hóspede e o peixe, aos três dias fedem. (Visita que não vai embora…)
- O que me deves me paga, que o que eu te devo não é nada.
- Neste mundo mesquinho, quando há para pão não há para vinho.
- “Alfaiate mal vestido, sapateiro mal calçado.” (em casa de ferreiro…)
- Quem para si não sabe, não ponha escola.
- “Cacarejar e não pôr ovo.” (Falar muito e fazer pouco)
COERÊNCIA
Antônio Vieira teria no máximo seis anos, porque o fato deu-se em Lisboa e ele viria para o Brasil em 1614. Um cônego, no adro da antiga Sé, conversava com o menino e quis saber de quem ele era filho:
– De quem sois, meu menino? – disse ele.
– Devo ser de vossa mercê, pois que me chama de “seu” – respondeu o garoto, com muito atrevimento.