Arquivo da Categoria ‘De 1600 a 1700’

Irritado um cavalheiro com seu lacaio, que era muito ingênuo, lhe disse:

– Sobe amanhã ao meu quarto, que quero dar-te uma tunda.

No dia seguinte, o bonacheirão do lacaio bateu à porta de seu amo, dizendo:

– Senhor, venho para cumprir com o mandado.

Então seu amo lhe respondeu:

– Tiveste demasiada pressa; eu não posso cumprir com o oferecido, porque já não tenho cólera.

Estando para casar-se um cortesão de avançada idade, cheio de achaques, lhe disse a Rainha:

– Como te casas com uma mulher tão velha, tão feia e que cheira tão mal?

E o cortesão respondeu:

Senhora, sou porventura, moço, bonito e cheiroso?

Um vagabundo que acabava de se casar pedindo esmolas, disse à sua esposa:

– Vês esta perna enfaixada? Pois olhe, minha mulher, ela sozinha basta para manter um príncipe.

O presidente de um conselho ordenou a um dos oficiais da sala, que impusesse silêncio às pessoas. Ele, para cumprir com a ordem, a cada instante dizia: Senhores, calem-se! Tanto gritou aquele homem ruidoso, que se viu obrigado o presidente a mandar: Que se cale o oficial da sala!

Um matemático explicava os elementos de Euclides a um duque, e como este não pudesse entender nada deles, exclamou:

– Que diabo há de poder entender isso?!

E o matemático lhe replicou:

– Um diabo com paciência.

Um português referia com exageração a um castelhano as demonstrações de sentimento, que um rei de Portugal havia feito pela morte de uma filha, a quem amava muito. A cada demonstração que relatava, o castelhano, como que não lhe parecesse grande, lhe perguntava: E não fez mais que isso? Satisfazia o português á pergunta com outra demonstração maior, aumentando-as sucessivamente; a cada vez o castelhano respondia: E não fez mais? Ele as havia subido bem de ponto, muito além do verossímil;  contudo o castelhano trocista, voltou à pergunta: E não fez mais? A isso o português irritado, alteradamente disse: Ainda fez mais. E que mais, replicou o castelhano? Mandou, respondeu o português, que em todo o reino, ninguém cresse em Deus por três anos, para que Deus daqui em diante saiba como se há de portar com os reis de Portugal!