Arquivo da Categoria ‘De 1800 a 1900’

RUI VERBOSA

Rui estava em sua casa, certa noite, quando ouviu um cacarejar estranho no seu galinheiro.

Aproximando-se cautelosamente do galinheiro, com a bengala na mão, surpreendeu um ladrão que tentava fugir por cima do muro, com um saco de aves roubadas às costas.

O grande baiano imediatamente, dedo em riste, repreendeu o larápio:

– Ó delituoso pacóvio! Não te interpelo pelo valor intrínseco dos galináceos, mas por ousares transpor os umbrais de meu domicílio, seqüestrando-me bípedes à sorrelfa e à socapa! Se o fazes movido por penúria, transijo; mas se for com o intuito de mofar de minha prosopopéia, dar-te-ei com este cajado no topo da sinagoga, até reduzir-te a massa encefálica em cadavérica!…

E o ladrão, coçando a cabeça, atarantado:

Dotô, isso quer dizer que eu levo ou deixo as galinhas?

DISCURSO EM LATIM

Rui Barbosa, quando foi candidato à Presidência da República, andou pelo interior do Brasil, em campanha. Certa vez chegou a um lugarejo onde o prefeito era do seu partido.

O prefeito conseguiu reunir alguns de seus cidadãos no salão paroquial, e apresentou o ilustre orador. Rui subiu numa cadeira, e discursou duas horas no português mais castiço e erudito. Os matutos olhavam-se sem entenderem coisa alguma. Ao final, uns tinham ido embora, outros cochilavam, e apenas o prefeito aplaudiu.

Ante a visível decepção de Rui, disse-lhe o prefeito:

– Vossa senhoria não “arrepare”, Dr. Rui, mas o Sr falou em latim, e essas bestas não entendem latim…

JORNALISTA

Nos jornais cariocas de antigamente havia a figura do repórter cavador, que era uma águia para descobrir notícias, mas de escassíssima cultura, quase analfabeto.

Um deles era o que usava o nome de guerra Baioneta. Baioneta considerava-se um craque para achar títulos de efeito para as locais desalinhavadas que escrevia – pena que o secretário de redação não os deixava irem para a composição…

São de Baioneta: Roubo Egrégio que se referia ao roubo ocorrido dentro de uma igreja; O Pé Decapitado, notícia de um desastre em que um bonde cortara o pé de um transeunte.

Mas ele tinha melhores: A uma briga de meninos à saída da escola intitulava o repórter – Briga Escolástica; noticiando um suicídio, em que a vítima era sujeito de alta posição no comércio, escrevia o Baioneta: Grande Suicídio!; e numa simples reclamação dos moradores de uma rua empoeirada, figurava o título: Rua Pueril.

Ao título proposto de Infanticídio e Adultério, o secretário estranhou:

– Infanticídio está bem; mas adultério, Baioneta? Isso foge à linha do jornal…

– Pois se o criminoso matou uma criança e… um adulto?

DESCRIÇÃO PRECISA

Quando se inventou a máquina de escrever, um curioso foi ter a um deputado nortista que recém viera da Europa, e indagou dele como era a tal máquina.

O deputado concentrou-e, pigarreou, cuspiu, tossiu, assuou-se e, sem quebrar a linha, falou:

– O curioso amigo conhece a máquina de costura?

– Conheço – respondeu o outro

– Digo, dessas “Singer”…

– Conheço, conheço!

 – Mas não é das de mão, não; é das de pé.

– Conheço.

– Pois olhe: a máquina de escrever é totalmente diferente!…

SORTUDO

Dois elegantes, de chapéu alto, fraque e bengala, passeiam num parque. Diz um deles referindo-se à uma bela dama que segue um pouco adiante:

– Aquela é a rapariga por quem o Lima e o Neves se bateram.

– Ah! Sim? E quem foi o feliz mortal?

– Foi o Lima… ela casou com o Neves.

MADRUGARAM

Encontrando-se um sujeito com uns ladrões pelas três horas da manhã num caminho no campo, lhe disseram eles depois de o roubarem: “É bem feito para não vir a estas horas por este lugar!”

Respondeu-lhes o miserável:

– Eu não cuidei que vossas mercês abrissem a loja tão cedo.