Arquivo da Categoria ‘De 1600 a 1700’

DISCURSO IDEAL

Um rei passando por uma pequena cidade do interior do seu reino, foi recebido pelo presidente da câmara municipal, o qual oferecendo a El-rei algumas garrafas de vinho e algumas peras, disse-lhe:

– Senhor, oferecemos à vossa majestade o nosso vinho, as nossas peras, e os nossos corações; é o melhor que possuímos.

El-rei, sorrindo, bateu no ombro do presidente, e respondeu, agradecendo:

– Eis os discursos que me agradam – breves!

OFERTA E DEMANDA

Quando se descobriram as esmeraldas na América, um espanhol trouxe uma a um lapidário italiano, e lhe perguntou qual era o seu valor. O lapidário respondeu: “Cem escudos”. Pouco depois voltou com outra esmeralda ainda maior que a primeira, a qual foi avaliada em trezentos escudos.

Contentíssimo de sua boa fortuna, o espanhol pediu ao italiano que o acompanhasse à sua casa, e lhe mostrou uma caixa cheia de esmeraldas. Mas o lapidário vendo a grande quantidade que havia delas, bem depressa lhe esfriou a alegria:

– Estas esmeraldas, senhor, valerão cada uma um escudo.

SERÃO TRÊS

Um jovem cavalheiro era muito viciado no jogo de dados, e muitas vezes quando tinha perdido todo o seu dinheiro, ia ele então empenhar a sua capa, e assim voltava para casa sem qualquer abrigo ou moeda, o que afligia muito a senhora sua mãe.

Para curá-lo desse costume, ela então mandou costurar nas costas de todas as camisas do filho, uma tela pintada com a imagem de dois burros. Quando o rapaz perguntou a razão de tal coisa, a senhora respondeu:

– Pois então, se perderes a capa, todos vão ver três burros!…

MELHOR

Um cardeal tinha por vizinho um ferrador, que um certo dia desapareceu da vizinhança. Indo tempos depois o cardeal a outra cidade, em certa missão do Papa, ficou doente. Tendo sido constituída uma junta médica, entre eles veio o ferrador, por médico mais afamado.

Reconhecendo-o, o cardeal o pegou à parte, e perguntou-lhe:

 – Quem te fez médico?

Respondeu o outro:

– Saiba vossa eminência, que não mudei de ofício! Do mesmo modo como antes curava as bestas, agora curo os homens. E vai tudo melhor, porque além de acertar nas curas melhor que os demais médicos; se acontece de ir algum doente para outra vida, ninguém me cobra por isso! Como vossa eminência, que me fez pagar uma mula do vosso coche, por me morrer nas mãos…

DESNECESSÁRIO

Um arcebispo tinha convidado um poeta a jantar, a fim de o fazer assistir  a um sermão que Sua Grandeza tencionava pregar, nesse dia, a vésperas. O poeta deixou-se adormecer numa poltrona, ao levantar da mesa; e como o prelado insistisse com ele para o levar ao sermão:

– Obrigado, Monsenhor, obrigado – disse o poeta – eu durmo perfeitamente, sem isso.

ÓTIMO

Um pobre alfaiate admirava um mural na igreja, representando uma cena do inferno. O cura vendo-o, aproximou-se dele e perguntou-lhe:

–  Que tal vos parece o inferno?

– A mim me parece bom, senhor cura, – respondeu ele –  pois não vejo ali nenhum alfaiate.